Laerte Coutinho - Cartunista e Crossdresser

Laerte Coutinho, nascido em 10.06.1951, é um dos mais brilhantes desenhistas nacionais. Seu currículo é incrível: produziu material de campanha política para o MDB e para muitos sindicatos, colaborou com a revista O Pasquim (editada de junho de 1969 a novembro de 1991, conhecida por ser um veículo de oposição ao regime militar) e contribuiu também com a revista Chiclete com Banana (produzida entre 1985 e 1995, famosa pela publicação de material underground de qualidade), tratando-se de um sucesso editorial brasileiro. Em maio de 1990, chegou a lançar sua própria revista, Piratas do Tietê. Laerte possui uma obra vasta e seu trabalho é publicado diariamente em diversos jornais do País. Recebeu inúmeros prêmios, tendo amplo reconhecimento internacional.

Laerte criou personagens icônicos: os Piratas do Tietê, Overman, os Gatos, Deus, Suriá, Hugo Baracchini e Los Tres Amigos, sendo este último trabalho em parceria com Angeli, Glauco e Adão. Todavia, uma tragédia familiar, o falecimento de seu filho em 2005, fez com que ele repensasse seu trabalho, chegando a afirmar que sentiu vergonha de quase tudo que já desenhou, abandonando as tirinhas de personagens, passando a produzir trabalhos com uma nuance mais filosófica ou nonsense, mas mantendo a mesma qualidade e o mesmo humor.

O único personagem mantido por Laerte foi Hugo Baracchini. Inicialmente, o personagem passou a se vestir de mulher para fugir de uma dívida com a máfia, mas depois adotou o estilo de vida crossdresser. O próprio Laerte explicou a importância desse processo criativo em sua vida pessoal: "Foi em 2004. Joguei a tira do Hugo na qual ele se vestia de mulher gratuitamente, não estava fugindo da máfia nem nada. Ele simplesmente se veste de mulher e sai à rua. Isso chamou a atenção de uma crossdresser, de uma travesti, que me contactou por e-mail e disse "será que você não tem isso também?". Funcionou como uma porta aberta."

Imagem extraída de http://murieltotal.zip.net/arch2009-03-08_2009-03-14.html

Em 2009, Laerte começou a utilizar roupas femininas, passando a se reconhecer o crossdresser. Letícia Lanz, que também é crossdresser, explica o significado dessa expressão: "Os termos crossdresser, travesti ou 'transgênero' são usados para descrever um homem que regularmente assume a aparência do gênero feminino a fim de satisfazer uma profunda necessidade pessoal. Usamos preferencialmente o termo 'crossdresser', ou simplesmente CD, por estar menos desgastado pelo uso comum". O grupo Brazilian Crossdresser Club, que reúne praticantes de crossdresser de todo o Brasil,  explica o seguinte: "O termo 'Crossdresser' foi importado para o Brasil em 1997, mesmo ano de criação do BCC e numa tradução literal significa 'vestir-se ao contrário'. Nos Estados Unidos e Europa este termo é muito comumente utilizado e ajuda a diferenciar a fantasia de usar roupas do sexo oposto das opções sexuais de cada um."

Imagem extraída de http://moda.ig.com.br/modanomundo/ser+mulher+e+muito+caro/n1237812404702.html

Laerte explica a motivação dessa prática: "Não faço isso porque a vida está sem graça. O problema é a vida submetida a essa ditadura dos gêneros, a esses tabus que não podem ser quebrados. É você sentir que sua liberdade está sendo tolhida, que as possibilidades infinitas que você tem de expressão na vida, ao sair, ao se vestir, ao se manifestar, ao tratar as pessoas, seu modo, seu gestual, sua fala, tudo isso é cerceado e limitado por códigos muito fortes e muito restritos. Isso é uma coisa que me incomoda."

Imagem extraída de http://murieltotal.zip.net/arch2010-11-21_2010-11-27.html

Laerte publica as experiências de Hugo Baracchini como crossdresser no Blog da Muriel. O blog é interessante porque concentra todas as experiências do personagem, desde a primeira vez que ele se vestiu de mulher, não poupando nem sequer relevar suas crises existenciais. Laerte utiliza este espaço para promover ideias interessantes referentes a direitos civis e questões relevantes de gênero, sem perder o bom humor. Um trabalho realmente genial!

Imagem extraída de http://murieltotal.zip.net/arch2011-05-22_2011-05-28.html

Referência:

FINOTTI, Ivan. Cartunista Laerte diz que sempre teve vontade de se vestir de mulher. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/825136-cartunista-laerte-diz-que-sempre-teve-vontade-de-se-vestir-de-mulher.shtml. Acesso em 10 nov. 2011.

ARMANDO, Antenore. Laerte: 'Tenho vergonha de quase tudo que desenhei'. Disponível em: http://bravonline.abril.com.br/materia/tenho-vergonha-quase-tudo-desenhei-laerte. Acesso em 10 nov. 2011.

RODRIGEZ, Diogo. Paradoxo de Salto Alto. Disponível em: http://revistatrip.uol.com.br/so-no-site/entrevistas/paradoxo-de-salto-alto.html.  Acesso em 10 nov. 2011.

BRESSER, Deborah. "Ser mulher é muito caro”. Disponivel em: http://moda.ig.com.br/modanomundo/ser+mulher+e+muito+caro/n1237812404702.html.  Acesso em 10 nov. 2011.

LANZ, Letícia. Crossdresser: Um resumo "básico do básico". Disponivel em: http://www.leticialanz.org/definicoes/def_crossdresser.htm.  Acesso em 10 nov. 2011.

www.bccclub.com.br.  Bem vindos ao BCC: Existimos pelo prazer de ser mulher. Acesso em 10 nov. 2011.

"O problema em relação à política de gênero, códigos, tabus, eu também faço parte disso. Até hoje essa coisa passa pela minha cabeça. Preconceitos. Não virei outra pessoa." (Laerte).